Friday, November 11, 2005

Tu - Vítor Costa

Deitei-me na intersecção de uma esquina formando uma tangente virtual. De imediato senti olhares indiscretos furiosos pelo status da minha presença. Como um periscópio, revirei os meus olhos na direcção da parede obscura dessa esquina. Tatuadas no seu corpo rugoso estavam apenas duas letras: TU. Impelido pela curiosidade levantei-me e observei novamente. Aproximei-me e contornei o debruado das letras no singelo cimento com o meu indicador. O caminho era sinuoso, mas bastante retórico. O seu significado parecia flutuar para o divã de um Freud. Atingindo o fim senti uma paz interior rejuvenescedora. Voltei-me e deparei com um miúdo a observar-me perto do lago. A sua face era lânguida e arredondada. Tinha o cabelo espetado e feições angelicais. O seu corpo esguio e pequeno parecia uma marulha de papel. E os seus olhos eram diferentes, especiais. Não consegui evitar o seu hipnotismo mirabolante. A insustentável leveza do seu olhar focou os meus olhos como uma lente microscópica. Uma sensação de dejà-vu percorreu o meu inóspito inconsciente. Confuso e desorientado tentei encontrar o norte na minha bússola. No entanto, um estranho campo magnético impedia o meu movimento. Os meus sentidos estavam a passar por um autêntico triângulo das bermudas. Já não conseguia aceder ao meu cérebro, uma vez que este rejeitava todas as minhas passwords. Amarrado nas vicissitudes de um colete-de-forças invisível rendi-me à evidência.

1 Comments:

Blogger causaefeito said...

Errata: Ups... deveria estar muralha em vez de marulha... Sorry

10:11 AM  

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